CONSUMAÇÃO MÍNIMA:  INCIDÊNCIA DE ISS

 

por DANIEL BARBOSA LIMA FARIA CORRÊA DE SOUZA

Porto Alegre (RS) – escrito 11/07/2007

 

 

1. Hodiernamente, indaga-se a respeito da incidência ou não de ISS (Imposto Sobre Serviços) sobre a consumação mínima para ingresso em estabelecimentos cuja atividade se enquadre no item 12.06 da Lista de Serviços Anexa à Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003.

 

2. Irrefragavelmente, a Constituição Federal estabelece, em seu artigo 156, inciso III, competir aos Municípios a instituição de impostos sobre “serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar”.

 

3. Em cumprimento ao mandamento constitucional, a União, em 31 de julho de 2003, editou a Lei Complementar n° 116, publicada no Diário Oficial da União em 1º de agosto de 2003, a qual “dispõe sobre o Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, e dá outras providências.”

 

A União tem competência para editar a Lista de Serviços e as normas gerais de instituição do ISS, cabendo ao Município, nesses aspectos, apenas reproduzir a legislação federal, no caso, a Lei Complementar n° 116/2003 (art. 30, inciso III).

 

4. Os Municípios têm a obrigação, nos termos do art. 11 da Lei Complementar n° 101/2000, de instituir, cobrar e efetivamente arrecadar todos os tributos de sua competência, dentre os quais, o ISS, sob pena de configurar renúncia de receita.

 

5. Qualquer imposto, para ser legalmente cobrado dos contribuintes, deve estar previsto em lei, observando-se, como regra geral, o princípio da anterioridade tributária, como no caso do ISS. Ademais, é imperioso que a lei instituidora do tributo especifique todos os seus elementos essenciais[1]. Conforme assevera Hugo de Britto Machado[2]:

 

Todos os elementos essenciais da relação jurídica tributária devem estar indicados na lei. O núcleo do fato gerador [em abstrato] do tributo, o contribuinte, a base de cálculo, a alíquota, tudo deve estar na própria lei.

 

6. O item 12.06 da Lista de Serviços Anexa à Lei Complementar nº 116/2003 aduz incidir ISS sobre:

 

12 – Serviços de diversões, lazer, entretenimento e congêneres.

                12.06 – Boates, taxi-dancing e congêneres

 

Ao perlustrar o item 12.06 da Lista de Serviços em apreço, infere-se haver incidência de ISS pelo fornecimento de serviços de diversão, notadamente em boates, casas noturnas e estabelecimentos congêneres. Como regra geral, o consumidor de tais serviços paga uma entrada, ingresso ou bilhete para adentrar em tais estabelecimentos.

 

Considerando que a base de cálculo do ISS é, efetivamente, o preço do serviço, com supedâneo no artigo 7º da Lei Complementar Federal nº 116/2003, temos que o valor despendido pelo consumidor a título de entrada, ingresso ou bilhete será a base de cálculo do ISS. Nesse sentido, é a jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça:

 

TRIBUTÁRIO - ISS - DIVERSÕES PÚBLICAS - FATO GERADOR - ARTIGOS 114 E 116 DO CTN.

1. O fato gerador do ISS reside na efetiva prestação de serviço, definido em lei complementar, constante da Lista de Serviços anexa ao Decreto-Lei 406/68.

2. Em se tratando de ISS incidente sobre diversões públicas, o fato imponível se configura no momento da venda do ingresso ao consumidor, pelo que ilegítima a antecipação do recolhimento, quando da chancela prévia dos bilhetes pelo município.

(REsp 159.861/SP, Rel. Ministro  HUMBERTO GOMES DE BARROS, PRIMEIRA TURMA, julgado em 13.10.1998, DJ 14.12.1998 p. 109)

 

TRIBUTARIO - ISS - DIVERSÕES PUBLICAS - FATO GERADOR - ARTIGOS 114 E 116 DO CTN.

1. O FATO GERADOR DO ISS RESIDE NA EFETIVA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO, DEFINIDO EM LEI COMPLEMENTAR, CONSTANTE DA LISTA DE SERVIÇOS ANEXA AO DECRETO-LEI 406/68.

2. EM SE TRATANDO DE ISS INCIDENTE SOBRE DIVERSÕES PUBLICAS, O FATO IMPONIVEL SE CONFIGURA NO MOMENTO DA VENDA DO INGRESSO AO CONSUMIDOR, PELO QUE ILEGITIMA A ANTECIPAÇÃO DO RECOLHIMENTO, QUANDO DA CHANCELA PREVIA DOS BILHETES PELO MUNICIPIO.

(REsp 4.962/SP, Rel. Ministro  HUMBERTO GOMES DE BARROS, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17.08.1994, DJ 19.09.1994 p. 24646)

 

Dessarte, é devido ISS sobre o valor cobrado a título de ingresso em estabelecimento comercial do gênero boates, casa noturnas e congêneros.

 

7. Outrossim, importa aclarar o sentido do termo Bilhete de Entrada, o qual pode ser conceituado como o valor cobrado a título de entrada em estabelecimento do gênero mencionado no item 12.06 da Lista de Serviços Anexa à Lei Complementar nº 116/2003, independentemente da nomenclatura utilizada. Ainda, podemos considerar como sinônimo de bilhete de entrada:ingresso, couvert artístico, consumação mínima, ou, ainda, qualquer outra nomenclatura que indique a cobrança pela entrada e fruição do serviços em tela.

 

8. A consumação mínima é o valor cobrado do consumidor a título de consumo mínimo em produtos fornecidos pelo proprietário da Casa Noturna. Em muitas vezes, é um substituto do ingresso de entrada.

 

A consumação mínima é uma prática vedada pelo Direito do Consumidor, nos termos do Artigo 39 do CDC, porquanto se constitui em exemplo de venda casada.

 

Não obstante, a despeito da vedação imposta pelo Direito Consumerista, o Direito Tributário adota o princípio do “non olet”, isto é, o dinheiro não tem cheiro. Não possui relevo, para o campo tributário, à afronta ao Direito do Consumidor. Possui realce o fato de o consumidor despender quantia para se divertir, o suficiente para configurar a hipótese de incidência contida no item 12.06 da Lista de Serviços em apreço. Assim, configurado o fato gerador em concreto, há a incidência da norma tributária.

 

9. Portanto, é possível a incidência de ISS sobre os valores cobrados à título de consumação mínima.

 

10. Em São Leopoldo, ad exemplum, foi editada em 2005 a Lei 5607, a qual proíbe a cobrança de consumação mínima nos estabelecimentos em apreço, em consonância com o artigo 39 do Código de Defesa do Consumidor. Conquanto não seja mais viável a cobrança, pelos estabelecimentos empresariais em testilha, de consumação mínima, nos termos citados, é imperioso destacar que por um longo período esta prática se concretizou na cidade em apreço e se realiza em várias cidades do Brasil.

 

11. Dessa forma, respeitado o prazo prescricional do tributo em liça, deve haver incidência de ISS sobre a consumação mínima cobrada nos últimos cinco anos.

 

12. Diante do exposto, obtempere-se incidir ISS sobre a consumação mínima. Ademais, respeitado o prazo prescricional do tributo em liça, deve haver incidência tributária  sobre a consumação mínima cobrada nos últimos cinco anos pelos estabelecimentos destacados no item 12.06 da Lista de Serviços Anexa à Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003.

 

CURRÍCULO RESUMIDO

 

DANIEL BARBOSA LIMA FARIA CORRÊA DE SOUZA

 

Procurador do Município de São Leopoldo (RS). Especialista em Direito Constitucional pela Universidade Potiguar e Faculdade do Prof. Damásio. Especializando em Direito Tributário. Diplomado no Curso Preparatório à Carreira do Ministério Público - ESMP (Fundação Escola Superior do Ministério Público - RS). Bacharel em Direito pela PUC-RS. Ex-Consultor Jurídico do Município de Gravataí (RS), ex-Assessor Jurídico do Ministério Público/RS.

 

 


 

[1] MACHADO, Hugo de Britto. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Malheiros, 28ª ed., 2007, p. 110.

[2] MACHADO, Hugo de Britto. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Malheiros, 28ª ed., 2007, p. 110.